A corrente
Colecionador > Parte 2
Sergio Valério
A
corrente era muito pesada e para poder se movimentar era necessário carregá-la
e isto lhe causava cansaço e dor, porém o seu dono não parecia nem ao menos
perceber o desconforto que ela lhe causava.
A
distância que a corrente lhe permitia alcançar poderia apenas levá-lo até a
velha casa de madeira, carcomida pelo tempo e umedecida pela chuva ou até às
velhas tijelas onde se alternavam água quase sempre quente e a ração nem sempre
de todos os dias.
Apenas
quando chegava a noite e ninguém mais permanecia no local é que ele era solto.
Ah! Como lhe fazia bem correr por todo o espaço da fábrica, porém a alegria não
conseguia ser total porque ele havia se tornado um cão estressado, depois de
tantos anos preso todas as noites naquela corrente enferrujada e tão hostil.
Ele já não se lembrava
muito bem do dia em que aquele homem o levara para a sua casa, mas as poucas
lembranças eram muito boas, afinal de contas todos brincaram com ele e passaram
a mão em seu pelo. Como havia sido feliz aquele tempo, porém quando cresceu
ganhou “de presente”,aquela corrente que, na
época, era nova e brilhava a cada raio de sol.
Hoje a sua vida era
simplesmente fazer a guarda da fábrica à noite, latindo para todos que se
aproximavam do portão e durante o dia, ficar acorrentado vendo os operários
passarem, para cá e para lá.
No mundo inteiro, cada
vez mais, estavam sendo discutidos e defendidos os direitos humanos, porém
naquela fábrica, a corrente permaneceria até que um dia Deus, em sua compaixão,
o levasse para junto de si.
Ele então correria
entre as nuvens, sem ouvir o tilintar angustiante daquela corrente e sentiria o
vento bater em seu rosto, beijando-o com o doce sabor da liberdade.