Uma caixa de papelão
Colecionador > Parte 1
Sergio Valério
As luzes da cidade ainda estavam acesas na esquina da Avenida São João
com a Avenida Ipiranga. Há alguns metros dali, em uma caixa de papelão, lá
estava ela, sozinha, tentando se esconder do vento frio que vinha do
Anhangabaú.
Os carros não paravam de
passar, pois em São Paulo, nada para e, em sendo assim, ela já se acostumara
com esta diferente canção de ninar que a fazia adormecer nos últimos dias em
que escolhera ali para ser a sua casa.
O incrível é que, mesmo
com tantas pessoas passando para lá e para cá, com tanta agitação, aquela caixa
de papelão ficou naquele canto sem que ninguém a quisesse pegar para jogar no
lixo ou qualquer outra coisa assim. Coisas impossíveis de se explicar acontecem
a toda hora e essa era uma delas...
Já estavam longe os tempos
em que era a querida moradora daquela casa, quando recebia muito carinho
daquela senhora que a tratava como sua própria filha.
Um dia, sua dona tinha ido embora, levada pelos netos e filhos em uma
estranha caixa de madeira e, logo depois, havia sido levada por um carro até um
lugar estranho, que não conhecia. A porta se abrira e ela fora colocada na
calçada. Não houve tempo para mais nada, pois foi impossível alcançar o veículo
que tinha ido embora. Restara apenas caminhar e caminhar por ruas que nunca
tinha passado.
Daquele dia em diante, sua
vida consistira em vagar e vagar por aí, até conhecer um cão que ficara com ela
por alguns tempos, até ser atropelado por um caminhão.
Agora, sozinha naquela
caixa de papelão, ela não entendia muito bem o que estava acontecendo com ela,
com as dores no colo que se repetiam de minutos em minutos.
De repente, uma sensação
estranha ela sentiu. Olhou para baixo e viu sair, de dentro do seu corpo,
filhotes de cães. Ela olhou para eles com a mais terna sensação e os acolheu em
seu peito, descobrindo a maravilhosa sensação de ter se tornado mãe.
De repente, como se tivesse surgido do nada, a cadela viu o rosto de uma
mulher que sorria para ela e para os seus filhotes. Era Ana que passava por ali
e resolvera ver o que acontecia dentro daquela caixa de papelão.
Em mais alguns minutos, seguiam em um carro, a cadela, seus filhotes e a
mulher que resolvera adotá-los, em uma prova que finais felizes não acontecem
apenas em novelas.