O homem de terno cinza
Colecionador > Parte 1
Sergio Valério
Dr. Cláudio era um homem que não sorria. Em seu trabalho todos morriam de medo de ir até a sua sala, pois se no dia em que estava de bom humor, já era capaz de atirar flechas de críticas para todo lado, imagine em um dia de fúria, o que, aliás, era o seu normal.
Embora a figura de um patrão deste tipo já estivesse fora de moda, Dr. Cláudio tinha um incrível poder de fazer negócios que o mantinha como o executivo mais bem pago da empresa.
Seus funcionários se desesperavam quando o viam abrir a porta do escritório vestindo o famoso terno cinza que, coincidência ou não, era o sinal de que estava extremamente sem nenhuma chance de bom humor.
Naquela manhã de sexta-feira, ele chegou exatamente vestido daquela maneira, com a tradicional gravata preta, a camisa branca de bolinhas e os sapatos que pareciam brilhar mais do que a lua em noite cheia.
Dr. Cláudio não cumprimentou ninguém, apenas acenou para que Maria Lúcia fosse até a sua sala. Pelo vidro, os outros funcionários o viram gesticulando e a porta revestida com lã de vidro não foi suficiente para abafar os seus gritos.
Pouco depois, a secretária saiu chorando. Estava despedida. A razão? Um mero erro de português. Ela havia escrito a palavra quiser com z.
Os outros funcionários se revoltaram. Paulo falou: - Isso não pode ficar assim! Está na hora de darmos um basta para este homem que pensa que é o dono do mundo!
Palavra de ordem. Josefina concordou. Abreu apoiou. Marina levantou o braço e falou: - Vamos falar com ele! A porta praticamente foi aberta a oito mãos e todos entraram, quase que ao mesmo tempo.
Dr. Cláudio ficou de boca aberta, pois não acreditou quando viu o protesto coletivo. Todos falaram o que quiseram e o homem nem pensou duas vezes. Olhou firmemente para todos, levantou-se da cadeira, pegou o seu paletó cinza e saiu da sala.
Ele nem tentou pegar o elevador, desceu pelas escadas, de dois em dois degraus, alcançando rapidamente a calçada.
Dr. Cláudio parou para pensar se ia para a esquerda ou para a direita. Foi aí que ele viu um cãozinho no meio da rua. Um carro vinha em velocidade e iria atropelá-lo. Sabe-se lá porque, ele, num gesto repentino, se atirou a rua, agarrou o cachorrinho e rolou com ele pelo asfalto.
O carro passou como se fosse um cometa no céu. O silêncio em todos que viram a cena foi ensurdecedor.
Do outro lado da rua, Dr. Cláudio ria, abraçado ao cão. Um riso que ele jamais havia oferecido a alguém em toda a sua vida. O seu coração batia forte e logo depois ele voltava para a empresa ainda com o cão em seu colo.
Chegou chorando, pedindo desculpas a todos e ao encontrar-se com Maria Lúcia, ajoelhou-se e pediu perdão, enquanto ouvia os aplausos dos funcionários que há minutos atrás o criticavam.
Cães tem o poder de sensibilizar o mais frio dos mortais e Dr. Cláudio era mais um a descobrir esta simples e pura verdade.